terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Intrusa ou parceira?

Homens e mulheres falam sobre o uso da camisinha
Por Ana Kessler

Todo mundo anda com ela na bolsa, foi-se o tempo em que era escondida em fundos de gaveta. É vendida em qualquer farmácia, na boca do caixa do supermercado, em banca de jornal, inclusive. É vista até voando feito balão em shows de rock. Assunto recorrente ao se relatar Sexoum caso amoroso, "usou ou não usou?", ninguém ousa assumir que não. Na teoria, ela é a companhia ideal das companhias ideais: a camisinha. Mas na prática, será que todo mundo usa mesmo? Na hora "H", naquele exato segundo em que o beijo pega fogo e acende o resto do corpo inteiro, quando não dá mais pra segurar e você pede que o seu parceiro coloque o preservativo, ele topa sem reclamar?
Bem, a gente sabe que, se fosse espontâneo da parte deles, as mulheres não precisariam carregá-las pra cima e pra baixo. Bastaria que os homens as levassem em suas carteiras. Mas o furo é mais embaixo. Se sexo antes do casamento não é mais tabu, é pré-requisito e prevenir-se não é mais necessidade, é quase um ato de higiene pessoal como escovar os dentes, por que ainda há tanta relutância da ala masculina em usar camisinha?

Medo de brochar
Você já tinha parado para pensar na possibilidade de ser puro medo de falhar justo na hora da prova máxima da virilidade? Na opinião do consultor paulista Raul Marinho, de 39 anos, o principal motivo para eles não gostarem de usar a também chamada "camisa-de-vênus" é esse mesmo: "O grande medo de todo homem é sempre brochar".

"Eu não gosto que uma mulher me dê camisinha. É machismo com certeza e, pior ainda, é preconceito, pois penso: hum, está preparada para tudo e para todos. Mas sei que tenho que rever o meu conceito".

O gaúcho Fernando Zanetti, de 34 anos, assina embaixo. "Eu moro no sul. Imagina com aquela baita friaca, pelado e procurando ou tentando colocar a bendita camisinha e o tempo correndo... Pô, brochar é uma hipótese real".
Já para o técnico contábil Rafael Paulus, de 26 anos, esse problema fica em segundo plano. "Eu não tenho medo de falhar. Eu até gosto de usar camisinha porque consigo prolongar mais a relação". Ele aponta outro motivo como merecedor da aversão masculina. "O pior é o ato de colocar, ele quebra todo o clima".

Quebrando o clima
Argumento campeão dos campeões, citado por todos entrevistados, a quebra do clima na hora de botar o preservativo foi lembrada inclusive pelas mulheres. A carioca Camila - que prefere não divulgar o sobrenome, de 34 anos, é casada e previne-se contra gravidez com anticoncepcional em implantes subcutâneos. Ela, que tem uma relação de absoluta confiança com o marido, aboliu a camisinha há mais de dez anos. "Essa coisa de ‘pára tudo, bota esse treco', de fato, eu sempre detestei".
Fernando Zanetti concorda. "No auge do momento tem o famoso break, que pode gerar certo relaxamento, afinal eu preciso achar o maldito pacote da camisinha ou a própria camisinha. Onde coloquei? No bolso da calça (estou pelado)? Na carteira? Esqueci no carro? Que lado da cama? No criado mudo? No banheiro? No frigobar? Haja memória! E, principalmente, se eu estiver no trago, ela se esconde certo!".
Mas a empresária paulista Sabrina Martins, de 29 anos, ressalta que a interrupção dos preliminares não pode ser desculpa para não usar. "Por via das dúvidas, eu sempre tenho camisinha na bolsa e em casa. Acho que quebra o clima, sim, mas não me incomodo".

Machismo
Sabrina levanta um ponto interessante da discussão: quem deve prover a camisinha, o homem ou a mulher? É claro que a responsabilidade é mútua e não deveria haver preconceito nem de um lado, nem do outro. Ideal mesmo seria que ambos os parceiros fossem precavidos, afinal, os riscos de contrair doenças e de uma possível gravidez indesejada não são para todos? Mas, na prática, não é o que acontece. Há um machismo pairando no ar. E ele se revela de duas formas:

Camisinha na bolsa: Da parte dos homens, há uma tendência a achar que uma mulher que anda com preservativos na bolsa é, para usar um termo brando, "fácil". "Eu não gosto que uma mulher me dê camisinha. É machismo com certeza e, pior ainda, é preconceito, pois penso: hum, está preparada para tudo e para todos. Mas sei que tenho que rever o meu conceito, afinal, eu prefiro transar com a camisinha que ela me deu do que não transar", admite o gaúcho Zanetti.

Camisinha na carteira: Sair com um cara e descobrir que ele carrega um preservativo no bolso ou na carteira pode soar ofensivo para as mulheres? Esta é outra opinião da ala masculina que reforça a pouca pré-disposição à proteção espontânea. "Ao abrir a carteira para pagar uma conta, lá está a camisinha... E aí, como explicar? Fica uma situação constrangedora, a mulher pensa que você vai transar com ela naquela noite, o que pode acontecer, mas aquela camisinha ali pode estragar tudo", acredita Zanetti. "E levar no bolso da camisa é o fim, pois geralmente os packs são volumosos e com uma cor chamativa", complementa.
Raul Marinho ressalta que há uma diferença, no entanto, entre sair prevenido para um encontro casual ou primeiro encontro, e sair com uma paquera já conhecida. "O cidadão fica com aquele papinho besta de que é só brincadeira e quando a mulher viu, já foi. Coisa que não dá pra fazer com camisinha, pois ficaria óbvio que iria rolar mesmo, entende? Agora, se você combina de sair, já rolou uns amassos antes, você sabe que deverá rolar, aí você sai prevenido, sacou?". Raul cita ainda outros motivos pelos quais não é fã de camisinha na carteira. "Ela esquenta, amassa e acaba estragando, além de fazer muito volume".
Na contramão, o jornalista carioca Bernardo Tabak, 32 anos, diz não apenas ter um estoque de preservativos no bolso, na pasta, no porta-luvas do carro, na gaveta do armário, como adorar mulher prevenida. "Acho ótimo!!! E ainda mostra que ela gosta de sexo e sabe que pode acontecer a qualquer momento, o que a torna mais sensual já que ela reconhece e assume sua sexualidade!".

"Acho que o homem ainda não se garante. Ele tem medo da mulher que se apresenta como um ser humano que gosta tanto ou mais de sexo que ele. O mundo é machista ainda, mas está melhorando, principalmente porque as mulheres não querem machos ao lado delas".

Mas Tabak concorda que a sua forma de encarar a questão não é unânime. "Acho que o homem ainda não se garante. Ele tem medo da mulher que se apresenta como um ser humano que gosta tanto ou mais de sexo que ele. O mundo é machista ainda, mas está melhorando, principalmente porque as mulheres não querem machos ao lado delas, mas homens que saibam ser verdadeiros representantes do gênero masculino sem deixar de prestar atenção e tentar entender o outro gênero, o feminino. Quando o homem relaxar e entender que ela quer tanto quanto ele, os dois vão se dar muito melhor e ele vai poder satisfazê-la e se mostrar muito mais na cama".

Dificuldade de colocar
Um momento de grande tensão que as mulheres não sentem na pele, mas que deixa muito machão desconfortável, é o exato minuto de embalar o melhor amigo. "Colocar a camisinha exige certa habilidade, colocá-la ao contrário exige uma nova", observa Zanetti.
"A maioria das mulheres não sabe ‘jogar' com isso de ajudar o parceiro a pôr, aí fica o homem sozinho tendo que fazer isso. É muito mais legal quando a parceira ajuda, mas é muito difícil achar mulher assim", reclama Rafael Paulus. E sugere: "As mulheres deveriam experimentar a camisinha feminina uma hora, talvez sintam algo similar ao que os homens sentem".

Diminui o tesão
A falta de sensibilidade foi outro tópico que recebeu artilharia pesada dos homens - mas por incrível que pareça, nenhum dos entrevistados mencionou este quesito como o principal motivador da relutância em usar camisinha. Será que, se as mulheres fossem mais solidárias no ato de colocar o preservativo, como sugeriu Rafael Paulus, aumentaria a pré-disposição dos rapazes para a prevenção? Fica a questão para debate. "A camisinha diminui o tesão, não há o contato sexual do casal, pele a pele, aquele contato do beijo, do toque etc. Aquele calor, na hora H, desaparece, diminui a sensibilidade", reclama o gaúcho Fernando Zanetti.
"Depois que eu descobri a camisinha extra-large, minha vida mudou e isso faz uns quatro ou cinco anos. É bem melhor, mesmo para um cara normal", destaca Raul Marinho. Mas ele não perdoa: "É péssimo, atrapalha muito a sensibilidade, o clima, tudo. Não adianta querer dourar a pílula, mesmo a XL é muito ruim. Eu acho que é aí que a propaganda peca. Na prática, camisinha só não é pior que pegar Aids". E conclui: "Você pode viajar de ônibus ou de Mercedes, e chegar no lugar de qualquer jeito... mas não adianta falar que é a mesma coisa, porque não é".
Marinho, que iniciou a vida sexual antes do surgimento da Aids, acredita que é mais fácil doutrinar um jovem a usar camisinha do que alguém que já passou dos 40 anos. "Nos idos 1980, ninguém nunca usava, já que o pior que poderia acontecer era ter que tomar uma bezetacil. Rolava um estresse com gravidez, mas não havia o hábito do preservativo. Eu usei camisinha pela primeira vez na vida com uns 20 anos... E, a propósito, era bem pior, bem mais grossa do que as de hoje em dia".
O consultor paulista tem razão: as camisinhas evoluíram, e muito! E não apenas no quesito segurança X sensibilidade, mas também na variedade de opções. É possível encontrá-las em diversas cores, tamanhos, texturas e até sabores! Sexo é cumplicidade, tesão é conseqüência. Talvez uma alternativa para unir prevenção e prazer seja tornar a seriedade do momento um pouco mais lúdica. Rafael Paulus dá o toque: "Gosto de testar as com aromas porque é melhor, fica o cheirinho". E você, já experimentou inovar?
Uma questão totalmente relevante - e muitas vezes relegada a um segundo plano nos debates - é a importância do uso do preservativo nas variações de sexo anal e oral entre homens e mulheres. Sim, no sexo oral também há risco. Mas você conhece alguém que usa? Quase ninguém... E a resistência, dessa vez, não é restrita à ala masculina.
"Eu vejo que a maioria dos homens se preocupa com a camisinha para o lado deles, mas ninguém nem pensa em pô-la para receber sexo oral. Quer dizer, e nós, mulheres? Se bem que fazer sexo oral com camisinha é o mesmo que comer borracha. Não dá!", alega Sabrina Martins.
"No sexo oral é péssimo, eu prefiro nem fazer. Fica esquisito, a camisinha fica evidente, a situação fica ridícula, é tudo ruim. Já no sexo anal, a disposição masculina em usar é bem maior. Digamos que a sensação de ver seu melhor amigo literalmente na m... não agrada. No sexo anal, o interesse próprio aumenta", define Raul Marinho.

"Não se pode falar mal da camisinha, muito pior é pegar o HIV. Mas melhor coisa do mundo é ter uma namorada e fazer o teste do HIV junto com ela, dar negativo e os dois correrem para a cama ".

"Não é a mesma coisa sexo oral com camisinha, mas eu faço. Sexo anal eu já fiz sem, mas a minha parceira é que ficou com uma infecção", lembra o engenheiro Luciano Rizzotto, de 36 anos. "Diversas pessoas fazem sexo oral sem proteção, mas depois usam preservativo para o ato sexual. Hipocrisia ou falta de conhecimento?
O certo seria a mulher fazer sexo oral com o homem, ele com camisinha, e o homem na hora do sexo oral, fazer com alguma espécie de papel-manteiga. É brabo, mas é o correto", complementa Fernando Zanetti.

Prevenção entre namorados
A estabilidade de uma relação freqüentemente leva alguns casais a abandonarem o uso do preservativo em troca de outros métodos contraceptivos. Cem por cento dos entrevistados para esta matéria confessaram não usar camisinha com as parceiras fixas. Sim, há inúmeras outras formas de prevenir a gravidez. Mas o que dizer das Doenças Sexualmente Transmissíveis e da AIDS? Não seria o abandono da camisinha uma prova de fidelidade arriscada demais?
Fazer um teste de HIV junto com a parceira é a primeira providência recomendada por todos. Já a prevenção à gravidez, por comodidade ou costume, ainda é função delegada exclusivamente às mulheres. Rafael Paulus cita, inclusive, um velho ditado sulista: "‘Gaúcho que é gaúcho não usa camisinha, manda plastificar'. Para evitar engravidar tem anticoncepcional. É mais barato e muito mais cômodo para o homem".
O engenheiro Rizzotto faz coro à praticidade dos exames laboratoriais: "A camisinha como meio de prevenção é eficaz e deve ser utilizada sempre que a pessoa não tiver parceiro fixo. O que tenho feito para contornar a situação com uma namorada é fazer exame de sangue e trocar com ela estas informações".
Fernando Zanetti também acha natural o abandono do preservativo entre duas pessoas comprometidas. "Depois de certo tempo de relação, o casal em comum acordo acaba decidindo não usar mais. Mas o correto seria fazer um teste de HIV num laboratório". Para o consultor Raul Marinho, a única ocasião em que o preservativo é unanimidade entre os homens é no sexo pago. "Casal estável, tipo namoradinhos, não rola usar. Comigo, pelo menos, nunca rolou e com os meus amigos, idem". E justifica: "O cara fica burro quando está focado em sexo".
"Não se pode falar mal da camisinha, muito pior é pegar o HIV. Mas melhor coisa do mundo é ter uma namorada e fazer o teste do HIV junto com ela, dar negativo e os dois correrem para a cama", acredita o jornalista Bernardo Tabak. Em relação à gravidez, Tabak ressalta: "Se inventarem a pílula do homem, eu tomo. Mas geralmente as mulheres encaram a pílula tranqüilamente. E uma coisa legal é dividir o preço da cartela. Olha que belo exemplo de romantismo e cumplicidade!", sugere.
A pílula masculina existe há anos. Ela causa os mesmos efeitos colaterais da pílula feminina e tem a mesma eficiência. Mas os laboratórios desistiram de lançá-la comercialmente por absoluto fracasso mercadológico, conforme resultado de amplas pesquisas: os homens não estão dispostos a usá-la. Talvez a única saída para a questão esteja mesmo, como afirma Raul Marinho, nas mãos das mulheres: "Não é difícil convencer o cara a usar camisinha. É só deixar claro que não vai rolar sem".
Postado por For Women às 21:42 |  
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